29 setembro 2010

A voz desaparecida...


Nas nossas lições da vida, tudo está no condicional: “Se o Papa fosse mulher, as galinhas teriam dentes”, “Se chovesse em Cabo Verde, o arquipélago seria verde”, “Se os países africanos tivessem realmente alcançado a independência há quarenta anos, isso saber-se-ia”…

Talvez sejam exactamente estas as frases do método, o homem altera-as, perverte o exercício; está farto do imperfeito do conjuntivo colocado ao serviço exclusivo de frases batidas e idiotas: se cá nevasse fazia-se cá ski.

Lá fora estão trinta e seis graus, nas pistas escaldantes do mês de Agosto; a quinta imperial ainda não lhe arrancou a sede, ou melhor: não lhe “matou a sede”, como dizem os portugueses.

A sede recusa-se a agonizar na arena do Verão, o touro da sede ainda está de pé. Nervoso, de pálpebras pesadas, o homem luta com os “se eu soubesse, teria feito”. “Se eu soubesse que o nosso mundo adormeceria assim, hipnotizado pela mediocridade, teria acordado e gritado, teria lutado, teria corrido mais riscos…”

É por isso que ele modifica as frases do exercício. Para se vingar do imobilismo geral do século XXI, que se anuncia decepcionante.

Ele próprio se sente pregado ao chão, como um avisador sem missão, retido na base.

Lisboa é uma cidade hábil em fintar a realidade, propícia a devaneios… na qual podemos contar os sinais perceptíveis de uma deriva eminente… uma cidade cujos encantos e cores não encontramos em mais nenhuma outra...

JYL



21 setembro 2010

Bairro do imaginário...


E hoje lembrei-me daqueles velhos tempos... daqueles tempos passados que já não voltam mais...
E lembrei-me dela... e tive saudades... e que saudades...

Saudades das palavras, dos risos e sorrisos, das lágrimas, dos ensinamentos, do que aprendi, das imagens, dos sons e até dos cheiros e dos sabores...
Oh! Os cheiros e os sabores...
Esses então seriam impossíveis de esquecer!
Mesmo se quisesse, era impossível arrancar do recanto mais profundo e escondido da minha memória, os cheiros e os sabores...
Era uma arte divina! Oriunda sabe-se lá de qual Oriente...

Transformava as compras do mercado em pratos exóticos... Era uma alquimista!

Pegava nas especiarias e legumes... e metamorfoseava em iguarias sumptuosas que perturbavam os sentidos...
E nós ali ficávamos... drogados, expectantes...


14 setembro 2010

Tempo...


- Não te preocupes, temos todo o tempo do mundo…

- Mais ou menos, não é bem assim…

- Mas eu quero pensar assim… o tempo soa mais suave…